Por Thiago Pinheiro
Aceitar a defesa de quem se tem laços emocionais, não é indicado ao advogado. Após ler os fatos articulados no processo, a defesa julgou moralmente seu cliente e se inclinou indiscretamente a condená-lo. Por isso, relutou em aceitar o caso, foi sincero com seus sentimentos e referenciais éticos. Mas, o acusado lhe era credor de dívidas imateriais, daquelas que nunca se pode livrar-se.
O advogado vocacionado, titubeou e entristeceu-se com a possível verdade da denúncia. Abandonou a velha frieza técnica dos casos penais mais complexos em que atuou até ali, e fracassou em separar a MORAL do DIREITO, isso em razão dos laços afetivos que guardava com o defendido. A acusação mais que juridicamente reprovável, era por demais constrangedora no plano ético, era a miséria humana sendo exposta exuberantemente, sem polidez alguma.
A cada testemunha ouvida, a revelação da natureza humana defeituosa na figura do cliente indigesto. O defensor trazia certa timidez no terno que vestia, na medida em que a relação de proximidade lhe contaminava com a poeira do parentesco. Pela vez primeira, ouve um encolhimento do advogado, antes fogoso no exercício da sua função, agora anestesiado pelos olhos vigilantes dos julgadores, os quais tentavam disfarçar em vozes educadas toda lástima de pensamentos reprováveis.
Percebia-se ali que o processo era formal, apenas para constar, vez que o resultado já se anunciava inescrupulosamente na mente de todos os presentes. Ao contrário do que se pensava, a postura do cliente era arrogante e reativa, negando infantilmente fatos cabalmente demonstrados, atuando como um sujeito aparentemente comprometido mentalmente, criando situações agressivas e álibis pouco coerentes.
Após o encerramento do martírio defensivo, o silêncio foi quebrado entre advogado e cliente com a afirmação fundada na teoria da conspiração de que todos lhe queriam prejuízo. Todos mentiam, todos armavam contra ele, restando para o advogado a acusação também de ter sido contra sua verdade. Em casa, percebeu tristemente que sua vocação profissional é circunstancial e relativa a determinados casos e pessoas.