Ao falar pela primeira vez após a ação de busca e apreensão feita pelo Ministério Público e Polícia Federal nas empresas do seu filho, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou hoje (29), durante reunião do diretório nacional do PT, que “ninguém precisa ficar com pena ou preocupado” com as investidas contra ele e familiares. Lula disse que se o objetivo dessas ações for “truncar o futuro do país” (em menção implícita à sua candidatura à Presidência em 2018), elas vão se repetir por mais três anos. “E eu lhes garanto que vou sobreviver, pois se tem uma coisa que aprendi na vida foi a enfrentar adversidades”, acentuou.
Num discurso em que falou muito mais sobre a conduta a ser adotada pelo partido em relação ao governo e à base aliada do Congresso Nacional do que à sua situação familiar propriamente – embora esse último trecho tenha sido o mais esperado por todos – o ex-presidente destacou que não vê motivos para o PT ficar “de cabeça baixa” com as críticas da oposição mencionando a legenda a atos de corrupção. Acentuou que o partido foi, a seu ver, “o que mais fez pela história do Brasil”. “Temos legado, temos história e temos tradição. Quando nos criticarem vamos mostrar e falar de tudo o que fizemos, dizer para eles pararem de ser bestas e olharem para o passado”, ressaltou.
Lula ainda disse que completou 70 anos, na última terça-feira (27), com a energia de quem tem 30. E ironizou afirmando que, a depender do tamanho da sua família, pode-se esperar bem mais pela frente. “Tenho três filhos que ainda não foram citados em denúncias, sete netos e uma nora que ainda por cima está grávida”, afirmou, numa referência à mencionada situação financeira de dois dos seus filhos, Fábio Lula da Silva e Luís Cláudio Lula da Silva, constantemente feita por oposicionistas. As empresas que foram objeto da ação do MP e da PF, durante nova etapa da Operação Zelotes, na última segunda (26), são de Luís Cláudio, mais conhecido como Lulinha.
Medida provisória
A Zelotes investiga fraudes cometidas por conselheiros do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) para reverter ou diminuir o tamanho de multas aplicadas por grandes empresas, num esquema de evasão de divisas que pode chegar perto de R$ 20 bilhões. A busca nas empresas do filho do ex-presidente foi feita por conta de um e-mail divulgado pelo jornal Estado de S. Paulo sobre suspeita de que teria havido lobby para a aprovação de uma medida provisória que concede incentivos para a instalação de montadoras no Nordeste e Centro-Oeste.
Conforme informações dos advogados do empresário, que nega as acusações, a questão não é a investigação da Operação Zelotes ter sido realizada, e sim, de terem sido deixadas de lado ações de busca e apreensão em bancos e grandes conglomerados empresariais já citados e com documentos bem mais incriminadores sobre a participação dessas empresas na fraude. Ao mesmo tempo em que foram priorizadas as apurações sobre o filho do ex-presidente e sobre o ex-secretário-geral da Presidência Gilberto Carvalho, também citado nas denúncias.
A reunião do diretório nacional do PT, agendada havia meses, sempre acontece a portas fechadas, mas desta vez teve um momento aberto ao público para a fala de Lula e a realização de uma espécie de desagravo ao ex-presidente, por conta dos últimos acontecimentos. Lula entrou no local em meio a aplausos e de “Parabéns pra você”.
O ex-presidente afirmou que nem a conjuntura política do país está no seu melhor momento nem o partido. “O PT tem recebido um bombardeio durante 24 horas por dia e isso tem uma explicação. Sabem que somos infinitamente maiores que companheiros que tenham cometido erros. Sabem que sempre que é colocado em xeque, este partido reage como se fosse uma fênix, ressurgida das cinzas. Vamos esperar as eleições de 2016 e saberemos o que realmente está acontecendo neste país.”
‘De frente’
Lula chamou a atenção dos integrantes da legenda para problemas observados que, segundo ressaltou, precisam ser encarados, como a desarticulação da base aliada e a necessidade de se fazer um ajuste fiscal. Citou, inclusive, o fato de o PT ter ganho as últimas eleições dizendo que não iriam ser feitas coisas que terminaram sendo realizadas. “Falo como quem viveu a crise de 2005 e lhes digo que nem sempre o presidente pode fazer somente o que pensa ou deseja. Precisamos encarar de frente essa questão”, disse.
O ex-presidente também falou sobre as alianças, acrescentando que foi preciso o governo fazer uma coalizão ampla, mesmo que com partidos que são considerados de direita. De acordo com ele, o problema observado hoje não é por causa dessas alianças, que considera importantes, mas pelo fato de os partidos estarem enfraquecidos e fracionados e, por isso, durante as votações do Congresso os parlamentares nem sempre atendem às orientações dos líderes. “Tem sido complicado fazer acordos no Congresso por conta desse enfraquecimento e também por causa do fator Eduardo Cunha (presidente da Câmara). É preciso entender que estamos vivendo uma situação que causa estranheza no Congresso Nacional”, afirmou.
Embora sem citar o ex-ministro da Casa Civil Aloizio Mercadante (atual titular do Ministério da Educação), de cuja postura os parlamentares reclamavam, Lula elogiou o atual ministro da Secretaria de Governo, Ricardo Berzoini, e disse esperar que agora a situação de relacionamento entre Executivo e Congresso esteja resolvida. “A primeira coisa que os deputados e senadores me reclamavam era que não estavam sendo ouvidos pelo governo e agora estão falando com Berzoini o dia inteiro. Eu sei que mesmo num período em que não se tem dinheiro para atender aos pedidos é importante o chamego, o carinho e a atenção. E tenho certeza de que isso não está mais faltando no relacionamento com o Congresso”, afirmou.
Sobre o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, Lula criticou os petistas que pedem a saída do ministro afirmando que “muita gente diz ‘Fora Levy’, como quem antes pedia fora FMI”. “Precisamos aprender a diferenciar as coisas e digo isso como quem já ouviu ‘Fora Palocci’, tempos atrás. O papel da Dilma é exatamente tirar o país dessa situação e tenham certeza de que quem mais quer resolver isso rapidamente é ela. Temos de lembrar que não foi o Levy o responsável pelo ajuste. As medidas já estavam definidas antes de ele ser escolhido ministro. É importante termos sempre em conta que as iniciativas que estão sendo postas em prática têm o objetivo de fazer o país voltar a crescer.”
Acordo com Cunha
Ao abrir o evento, o presidente do PT, Rui Falcão, mencionou as possibilidades de acordo citadas constantemente entre o partido e Eduardo Cunha (PMDB-RJ), negou que estejam acontecendo e frisou: “Quem tem acordo constante com Cunha é a oposição, não somos nós”. “Não vamos criar uma divisão entre nós aqui em relação a este assunto”.
Falcão chamou os petistas para ajudar a dar mais governabilidade ao país e a fortalecer a chamada Frente Brasil Popular nas próximas eleições. “O PT entrará unido na campanha eleitoral de 2016 (para prefeitos). Em vários outros momentos previram o fim do PT e saímos mais fortes e revigorados do que antes. É isso que voltará a acontecer”, concluiu.
Por Rede Brasil Atual