Em mais uma ofensiva para tentar reverter votos pró-impeachment no Senado, a presidente afastada, Dilma Rousseff, propôs, em carta, um plebiscito para consultar a população sobre novas eleições antes de 2018 e uma reforma política caso ela retorne à presidência efetiva. O texto, lido ontem no Palácio da Alvorada, é direcionado aos senadores, senadoras e ao povo brasileiro. No texto de quatro páginas, a petista reafirma ser vítima de um processo “injusto”, diz que é inocente do crime de responsabilidade e assume uma série de compromissos.
Na carta, Dilma usa o termo golpe para se referir ao impeachment, mas no condicional. Ela buscou abrandar o termo, para não irritar ainda mais senadores. “Afirmamos que, se consumado o impeachment, teríamos um golpe de estado. Um colégio eleitoral de 110 milhões de eleitores seria substituído, sem sustentação constitucional, por um colégio eleitoral de 81 senadores. Seria um inequívoco golpe seguido de eleição direta”, disse. A carta foi criticada pelos atuais governistas e até mesmo por petistas. A avaliação dos apoiadores de Dilma, nos bastidores, é de que, embora tenha feito uma série de compromissos, Dilma errou no momento de divulgar o texto — demorou demais — e não trouxe novidades.
Na última votação, o relatório do senador Antonio Anastasia (PSDB-MG) foi aprovado por 59 votos a 21. Para consumar o impeachment, no julgamento que começará em 25 de agosto, são necessários 54 votos dos 81 senadores. Na carta, a presidente defende o que chamou de Pacto pela Unidade Nacional, o Desenvolvimento e a Justiça Social, e diz que dará apoio “irrestrito” à convocação de um plebiscito para consultar a população sobre eleições antecipadas e reforma política eleitoral. A tese de novas eleições é defendida por senadores que se dizem indecisos, mas acabaram votando a favor do relatório e pela continuidade do processo. Apesar de ter sido vista como única saída, nem senadores petistas encamparam a proposta de fato na Casa.
Em seu recado, Dilma fala da importância de abrir o diálogo com o Congresso Nacional, com a sociedade civil, os movimentos sociais e empresários neste momento. Dilma também diz que deve haver o aumento de geração de empregos, fortalecimento da saúde e da educação e luta contra a corrupção. Antes de ser afastada, em maio, uma das principais críticas contra a petista era a ausência de diálogo.
Na carta, a presidente não chega a assumir erros, mas “acolhe críticas”. “Ouvi críticas duras ao meu governo, a erros que foram cometidos e a medidas que não foram adotadas. Acolho com humildade para construirmos um novo caminho”, afirma.
Dilma ainda disparou críticas indiretas ao governo interino e ao ex-presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que aceitou o pedido de impeachment, no início. “Ao contrário dos que deram início a esse processo ilegal, não tenho contas no exterior, nunca desviei um centavo e não recebi propina de ninguém”, afirmou. Por fim, a presidente reforça que não cometeu crime de responsabilidade e diz que houve “esforço obsessivo para desgastar o governo”. “O que peço às senadoras e aos senadores é que não se faça a injustiça de me condenar por um crime que não cometi. Não existe justiça mais devastadora do que condenar um inocente”, diz.
Dilma é acusada de crime pelo atraso no pagamento de subsídios para agricultores atendidos pelo Plano Safra no Banco do Brasil em 2015, prática chamada de “pedaladas fiscais”, e por editar decretos orçamentários sem autorização do Congresso. A presidente leu a carta na Sala dos Estados, no Palácio da Alvorada, após o fim do jogo de futebol feminino do Brasil contra a Suécia. Senadores que a defendem no Senado não foram avisados da divulgação da carta e acabaram surpreendidos.
Correio Braziliense