Defesa fala em anulação do acordo de colaboração; em sindicância interna, agente confirmou que escuta era ilegal e relata ambiente de pressão interna em Curitiba O doleiro Alberto Youssef presta depoimento na CPI da Petrobras, no prédio da Justiça Federal, em Curitiba (PR). A CPI deve ouvir os 13 investigados pela Operação Lava Jato que estão presos no Paraná
Rodolfo Buhrer/Reuters
Pela primeira vez em quase dez anos, e por decisão do Supremo Tribunal Federal, depoimentos e documentos que indicam que a Polícia Federal, sob o comando da extinta operação Lava Jato, grampeou ilegalmente a cela em que o doleiro Alberto Youssef ficou preso em Curitiba foram tornados públicos.
O doleiro é visto como “pedra fundamental” dos achados da investigação e hoje sua defesa cogita pedir a nulidade de seu acordo de colaboração, inclusive por conta da escuta ilegal.
Decisão do ministro José Antônio Dias Toffoli torna pública não só a petição da defesa de Youssef, como depoimentos de agentes da PF que, em campo na época da operação, chancelam as suspeitas da instalação de escutas ilegais. Entre os mais impactantes, está o testemunho de uma policial que confirma que ter acompanhado a instalação do grampo ambiental na cela, de maneira oculta, num momento em que Youssef e outros presos foram retirados do local.
Ela afirma que só depois, quando o próprio doleiro encontrou o grampo escondido na laje da carceragem, tomou conhecimento de que não havia autorização judicial para grampear as conversas no local —e de que, portanto, o grampo era ilegal.
O ministro Toffoli não só tornou públicos os documentos, como determinou que eles sejam enviados a diversos órgãos, que podem reexaminar as consequências legais da ação de agentes da Lava Jato envolvidos no caso, entre eles o procurador-geral da República, o advogado-geral da União e o Tribunal de Contas da União, já que houve emprego de funcionários, recursos e equipamentos públicos para grampear a cela.
Na prática, a decisão de Toffoli reabre caminhos para apuração que estava adormecida. Quando Youssef encontrou a escuta, investigação interna da PF eximiu os principais nomes da operação de responsabilidade e integrante da própria Lava Jato em Curitiba decidiu arquivar a queixa do uso ilegal de escuta ambiental na cela.
A defesa de Youssef reivindicou por anos a posse do conteúdo dos áudios captados pelo grampo ilegal. Só recentemente, após apuração do Conselho Nacional de Justiça, os advogados foram informados de que os áudios estavam guardados na Secretaria Judiciária da 13ª Vara Federal de Curitiba, comandado no auge da Lava Jato pelo hoje senador Sérgio Moro (União Brasil-PR).
O ministro Dias Toffoli afirma que, “pelo que se infere do apurado na seara administrativa, de fato ocorreu no âmbito da denominada operação “lavajato” a captação ambiental ilícita de diálogos envolvendo o ora Peticionário [Youssef] e terceiros que com ele interagiram, enquanto sob custódia em cela da Superintendência Regional da Polícia Federal em Curitiba, inclusive valendo-se de equipamento e petrechos pertencentes ao patrimônio da União Federal”.
O levantamento do sigilo da decisão e dos depoimentos sobre a sindicância na PF marca nova etapa nos questionamentos aos métodos da Lava Jato. À corregedoria da PF, a agente que participou da instalação do grampo não só afirma que soube após a descoberta do equipamento que a ação não tinha cobertura judicial, como também revela um ambiente de extrema pressão interna, com policiais sofrendo de ansiedade e depressão.
Segundo os achados, o grampo foi instalado por um policial de renome em Curitiba, Dalmey, que depois confessou não haver base legal para a instalação da escuta. Dalmey acabou tratando do assunto uma segunda sindicância aberta sobre o caso.
A agente da PF conta que reconheceu o equipamento como sendo da corporação assim que Youssef o encontrou na cela, que só então soube que não havia ordem judicial para a escuta e que ela estava ativa, ou seja, quando acionada, inclusive remotamente, gravava as conversas dos presos na carceragem.
Fonte: G1