O pesquisador Mauro Oliveira, professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Estado do Ceará (IFCE) e doutor em Informática pela Sorbonne Université, demonstrou estar preocupado com a falta de políticas para o avanço do uso da Inteligência Artificial (IA) no Brasil.
A dependência de serviços globais ofertados por big techs também preocupa. A instabilidade global nos servidores da Amazon Web Services (AWS), por exemplo, registrada na manhã desta segunda-feira (20), evidencia a vulnerabilidade de sistemas que dependem de poucas grandes estruturas de nuvem.
Segundo Mauro Oliveira, o problema é de decisão política. “A falta de compreensão dos nossos governantes de um mundo que vai acontecer vai desmantelar muita coisa. Nós não estamos discutindo a compreensão do quântico e da IA geral. Não está sendo discutido em canto nenhum”, disse em entrevista ao podcast Opinião Tech, do Opinião CE.
De acordo com o professor, a economia brasileira, baseada em commodities como os produtos do agro, é concentradora e “não é capaz de trazer a felicidade geral da nação”, já que “não é capaz de distribuir renda”.
“O Brasil é a 17ª potência mundial e está na 87ª posição no IDH, o que mostra que qualquer economia baseada em commodities é concentradora”, disse.
Oliveira afirmou que os líderes políticos precisam ser sérios — o que, conforme ele, está ficando “cada vez mais difícil” — e ter conhecimento para que a IA seja tratada como prioridade no País. Em pouco tempo, conforme o pesquisador, o cenário tecnológico global vai “afetar massivamente os empregos” e colocar a população “cada vez mais refém das big techs”.
COLONIZAÇÃO DIGITAL
Atualmente, o Brasil sofre o que vem sendo chamado de “colonização digital”. Diferente do que ocorreu no século XVI com os portugueses, a nova forma de colonização é impulsionada pelas IAs. O funcionamento, porém, não é muito diferente do que ocorria nos séculos passados, como explicou Mauro Oliveira:
“Se você pegar a história da colonização clássica, em que as potências sugavam as riquezas, (…) o que nós estamos passando agora não é diferente”, pontuou.
Na venda de um celular no Brasil, por exemplo, tirando impostos e logística, o País não fica com nenhum valor. “Todo o resto do dinheiro da venda de um aparelho desse vai para manter a qualidade de vida dos países que entenderam, há mais tempo, que uma economia baseada em conhecimento é muito mais rentável”, destacou.
Conforme o professor, foi por esse motivo que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, tem se reunido com as big techs, para fortalecer a indústria do conhecimento no país norte-americano e manter a política da colonização digital.
Segundo ele, países como os EUA e a China compreenderam isso porque possuem educação tecnológica, o que não ocorre no Brasil.
“Você tem um país como o nosso, que fabrica avião de nível internacional, de concorrência internacional; a gente criou o Pix, que foi uma coisa que os outros países não tiveram a mesma ousadia ou competência”, disse, frisando que o Brasil tem capacidade para pensar a política tecnológica.
EXEMPLO DO PIX E ATAQUES DOS EUA
Segundo o pesquisador, o Pix é um exemplo de que o Brasil possui capacidade para pensar nas políticas tecnológicas. O método de transferência instantâneo, conforme o professor, o impressiona mais a cada vez que pensa nele.
No último mês de julho, Trump fez uma série de ataques ao Pix, afirmando que se trata de uma prática comercial “desleal”. Como explicou Mauro Oliveira, a investida do presidente norte-americano ao modelo de pagamento ocorreu porque bandeiras como a Visa e a Mastercard — ambas dos EUA — deixaram de arrecadar em transferências por cartão.
“O que o Trump fez mostra que somos colonizados. O cara abrir a boca para dizer que estamos fazendo uma coisa errada, que é deixar de estar pagando à Visa e à Mastercard porque estamos usando uma tecnologia que a gente desenvolveu, jamais ele falaria isso para a Europa”, disse.
O professor reconheceu que houve rejeição à fala do presidente, mas que não foi o suficiente. “Uma sociedade educada não aceitaria isso. O europeu não aceitaria isso”, completou.