Após a queda do regime de Bashar al-Assad e sua fuga para um destino desconhecido, o grupo Hayat Tahrir al-Sham (HTS) declarou ter assumido o controle da Síria. Considerada uma milícia terrorista com vínculos históricos com a Al Qaeda, a origem do HTS remonta a um grupo conhecido como Jabhat al-Nusra, que foi criado durante a Guerra Civil Síria. Inicialmente, a organização jurava lealdade à Al Qaeda, mas em 2017, a milícia fez uma mudança significativa, renomeando-se como Hayat Tahrir al-Sham e distanciando-se da rede terrorista global. Essa mudança, porém, não impediu que o grupo continuasse sendo visto com desconfiança por potências ocidentais, que não reconhecem a transição do HTS para um ator político local legítimo.
O grupo, composto principalmente por combatentes sírios, passou a se consolidar como uma força autossuficiente no norte da Síria, especialmente após assumir o controle da província de Idlib em 2019. Em vez de apenas dominar militarmente, o HTS estabeleceu um governo de segurança, administrando a economia local e impondo a lei, com a maioria dos juízes sendo leais à sua causa. Essa estrutura de governança, que oferece serviços essenciais à população em colaboração com a ONU, é vista por alguns como uma alternativa pragmática à desorganização de outras partes da Síria. No entanto, o controle centralizado e autoritário do grupo é amplamente criticado por analistas internacionais, que apontam que, embora o HTS tenha tentado estabilizar a economia local, como subsidiar preços e estabilizar setores como os bancos e a energia, o controle rígido sobre os recursos e a população ainda limita seu potencial.
A mudança de postura do HTS em relação ao radicalismo jihadista é um tema debatido por especialistas. O líder do grupo, Abu Mohammed al-Julani, afirmou, em entrevista ao jornal francês *Le Figaro*, que o HTS não está mais comprometido com a jihad internacional, um movimento que, segundo ele, só leva à destruição. Ao invés disso, o grupo tem se concentrado em governança local, promovendo mudanças que incluem permitir que mulheres frequentem escolas, dirijam e até fumem nas ruas, o que é um contraste claro com a postura extremista anterior. Para analistas como Jérôme Drevon, do International Crisis Group, essa mudança de foco pode ser genuína, uma tentativa de redefinir o grupo como uma força insurgente, sem o objetivo de promover o terrorismo internacional. Essa mudança de estratégia, no entanto, ainda gera ceticismo, e os analistas sugerem que as potências ocidentais devem reconsiderar suas posturas em relação ao grupo à medida que ele tenta se inserir no complexo cenário político da Síria.