Parlamentares tentam aprovar texto em definitivo em menos de uma semana. Senador sugeriu emenda que pode aumentar montante de emendas; relator ainda não sinalizou se vai acatar. O Senado Federal deve votar nesta quarta-feira (13) o projeto de lei que estabelece novas regras de transparência para o pagamento de emendas parlamentares.
A proposta foi aprovada na Câmara dos Deputados na terça-feira (5) da semana passada e tramita com urgência pelo Senado.
Os parlamentares têm pressa para aprovar a proposta, já que desde agosto os pagamentos estão suspensos por determinação do Supremo Tribuna Federal (STF).
“O ideal é que possamos resolver esta questão do projeto até o feriado [de Proclamação da República]”, afirmou o líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (PT-AP).
Na última semana, Randolfe ainda afirmou que o Planalto tentaria mudar o conteúdo do projeto para permitir também a possibilidade de bloqueio do pagamento das emendas como forma de atender os limites do arcabouço fiscal.
No Senado, a relatoria do projeto ficou com o senador Angelo Coronel (PSD-BA), que busca “um texto consensual” para poder submeter a proposta à votação.
Ele ainda não indicou se aceitará emendas de senadores – o que pode levar a uma nova votação na Câmara e atrasar a conclusão do tema.
Veja no vídeo abaixo os detalhes da versão aprovada pela Câmara:
Câmara aprova projeto que muda regras pra emendas parlamentares, atendendo determinação do STF
A proposta
Pelo projeto, as emendas deverão, prioritariamente, ser destinadas para o custeio de políticas públicas. Apesar de não haver obrigatoriedade, o autor do texto, deputado Rubens Pereira Júnior (PT-MA), afirmou que os deputados poderão ser cobrados a colaborar com projetos estruturantes estipulados pelo governo.
Os órgãos do Executivo terão que publicar, até o dia 30 de setembro de cada ano, a lista de políticas públicas prioritárias a serem contempladas pelas emendas executadas no ano seguinte.
A lista deverá conter os projetos de investimento, as estimativas de custo e informações sobre sua execução física e financeira, além dos critérios adotados para a seleção dos investimentos em questão.
O governo poderá não executar emendas que:
não tenham despesa compatível com sua finalidade;
não tenham projeto de engenharia ou licença ambiental prévia, se não for comprovada a capacidade dos estados, do Distrito Federal ou dos municípios de fazerem a operação do projeto,
sejam incompatíveis com a política pública desenvolvida pelo órgão responsável pela sua programação, como os Ministérios, por exemplo.
O que pode mudar?
O texto que tramita atualmente autoriza o “contingenciamento” das emendas – ou seja, a suspensão de parte ou do total do pagamento das emendas para que o governo consiga cumprir a meta fiscal.
O contingenciamento é uma ação reversível. O governo contingencia trechos do Orçamento ao longo do ano, por exemplo, quando arrecada menos impostos que o esperado naquele período ou precisa lidar com um gasto imprevisto.
Neste cenário, o orçamento é ajustado conforme à expectativa de receita, comparada às despesas.
Segundo o projeto aprovado, esse contingenciamento acontecerá “na mesma proporção” da suspensão de despesas discricionárias (não obrigatórias) do governo, que envolvem custeio e investimento.
➡️ O governo defende que seja possível, além de contingenciar, bloquear as emendas parlamentares. Ambos são instrumentos preventivos.
O bloqueio serve para retirar essas emendas do cálculo dos limites do arcabouço fiscal – que define um teto para o aumento das despesas, que não podem subir acima de 70% do crescimento projetado pela inflação.
➡️ Na prática, a emenda também fica suspensa, mas como a comparação da meta é feita com um dado consolidado (as despesas do ano anterior), o bloqueio é uma medida mais difícil de reverter.
Um bloqueio só pode ser revertido se a despesa estiver dentro do limite do arcabouço.
Tendo os dois mecanismos à disposição, o governo ganha margem de manobra para ajustes. Sem o bloqueio, e somente com o contingenciamento, o Planalto teria que diminuir cada vez mais as despesas não obrigatórias, como obras, para dar conta das despesas obrigatórias, reduzindo assim, a capacidade de investimento.
O bloqueio estava previsto na proposta original, apresentada pelo deputado Rubens Pereira Júnior (PT-MA), mas foi retirado pelo relator na Câmara, Elmar Nascimento (União-BA).
“Isso é coerente com o Orçamento. Emendas são parte do Orçamento, cujos parâmetros estão na Lei de Responsabilidade Fiscal. Então, o que ocorre com o restante do Orçamento, dotação dos ministérios, do Executivo, do Judiciário, é óbvio que deve ocorrer com as emendas parlamentares. É nesse sentido que vamos argumentar pela restauração do texto original do termo bloqueio”, afirmou Randolfe.
‘Emendas PIX’
O projeto obriga o parlamentar que optar por enviar dinheiro ao seu reduto por meio de transferência especial, indicar em qual ação o recurso será utilizado e o valor da transferência. Os recursos deverão atender preferencialmente obras inacabadas.
Essa modalidade é conhecida como “emenda PIX” porque, além de o pagamento ser obrigatório, a transferência é feita diretamente para o caixa da prefeitura ou do estado, sem convênios ou indicação de uso. É como se a União fizesse, de fato, um PIX para o destinatário.
Esse mecanismo tem gerado críticas sobre a falta de transparência no uso das verbas.
Além disso, o projeto determina que o Tribunal Contas da União (TCU) fiscalize os repasses feitos por “emenda PIX” a estados e municípios.
O texto também impõe obrigações para quem recebe o dinheiro na modalidade PIX.
O beneficiário deverá, por exemplo, indicar nos sistemas de transparência do governo a agência bancária e conta corrente específica em que serão depositados os recursos, para que seja realizado o depósito e permitida a movimentação do conjunto dos recursos.
Os governos estaduais ou prefeituras deverão informar às Assembleias Legislativas ou às Câmaras de Vereadores e ao TCU, em até 30 dias: o valor do recurso recebido, o respectivo plano de trabalho e cronograma de execução.
Se houver indícios de irregularidades nos repasses ou inconsistências no plano de trabalho, os órgãos de fiscalização e controle poderão determinar os ajustes necessários.
Emendas de bancada
O projeto ainda prevê que as emendas definidas por parlamentares de um mesmo estado, as chamadas emendas de bancada estadual, só poderão ser destinadas para investimentos estruturantes – no caso, grandes obras ou “empreendimentos de grande vulto”.
Cada bancada estadual terá direito a até oito emendas. O senador Lucas Barreto (PSD-AP), no entanto, sugeriu que este número suba para 11.
As emendas poderão ser destinadas para políticas públicas ligadas às seguintes áreas:
educação;
saneamento;
habitação;
saúde;
adaptação às mudanças climáticas;
transporte;
infraestrutura hídrica;
infraestrutura para desenvolvimento regional;
infraestrutura e desenvolvimento urbano;
segurança pública;
turismo;
esporte;
agropecuária e pesca;
ciência, tecnologia e inovação;
comunicações;
prevenção, mitigação, preparação, resposta e recuperação de desastres;
defesa;
direitos humanos, mulheres e igualdade racial;
cultura;
assistência social;
outras políticas públicas, a serem definidas na lei de diretrizes orçamentárias do respectivo exercício.
Pelo texto, fica proibido destinar emendas de forma genérica em uma tentativa de contemplar diferentes obras.
As emendas também não poderão ser individualizadas pelos integrantes das bancadas – os estados com menos representantes têm 8 deputados e 3 senadores.
O projeto prevê que a bancada de um estado pode destinar recursos para outra unidade da Federação, desde que seja para projetos de amplitude nacional.
Além disso, a senadora Soraya Thronicke (Podemos-MS), propôs que os recursos sejam inseridos no mesmo Sistema Integrado de Planejamento e Orçamento (SIOP), do Ministério do Planejamento, onde já constam as emendas individuais.
Emendas de comissão
As emendas de comissão são recursos indicados por colegiados temáticos no Congresso — tanto da Câmara quanto do Senado. Não são impositivas — ou seja, não têm execução obrigatória.
Esse tipo de emenda não tem um valor previamente definido, nem um mecanismo de distribuição dos valores entre os colegiados. O montante destinado a essa categoria é definido anualmente, conforme as negociações para a aprovação do Orçamento.
Segundo uma resolução do Congresso, cada comissão tem direito a até oito emendas — o projeto não alterou esta regra e também não definiu como será a distribuição dos recursos entre as comissões.
Para especialistas, na prática, continuaria a valer a divisão política dos recursos, contrariando o princípio da igualdade.
As emendas de comissão sofreram um aumento nos últimos anos. Foram infladas depois de o STF derrubar as emendas de relator, conhecidas como “orçamento secreto”.
A categoria não herdou somente os valores, também manteve a opacidade do tipo considerado inconstitucional pelo Supremo:
não é possível identificar o nome do parlamentar que indicou a emenda;
é possível verificar somente a comissão autora das emendas, o ministério responsável pela execução e ação na qual será aplicado o recurso.
Segundo o texto, as comissões somente poderão indicar emendas para projetos de interesse nacional ou regional, que estejam de acordo com suas temáticas.
Mas uma sugestão da senadora Soraya Thronicke pretende ampliar a possibilidade de destinação de recursos para obras inacabadas, assim como no caso das emendas PIX.
Todas as indicações deverão conter, “de forma precisa”, o seu objeto (política e local de aplicação).
A proposta não deixa expressa, porém, a obrigação de indicar o padrinho das emendas — um dos pontos de opacidade.
Pelo projeto, no mínimo, 50% das indicações da bancada deverão atender a ações e serviços públicos de saúde.
As indicações das comissões serão feitas por líderes partidários. Membros da comissão analisarão os pedidos e aprovarão as destinações. O processo todo deverá ser registrado em ata e enviado aos órgãos de execução das emendas.
O projeto não estende as regras às emendas já aprovadas para o Orçamento de 2024. Pelo contrário, deixa claro que os mecanismos de identificação não se aplicarão a elas.
Continuidade das emendas
Na Câmara dos Deputados, o relator Elmar Nascimento previu em um dos artigos que as emendas não impositivas terão um recurso de R$ 11,5 bilhões para o próximo ano.
Essas emendas não têm pagamento obrigatório e podem ser canceladas pelo governo para garantir o atendimento das metas fiscais e do arcabouço.
O mesmo artigo ainda define que, a partir de 2026, o crescimento das emendas se dará da seguinte forma:
as emendas individuais serão aprovadas no limite de 2% da receita corrente líquida do exercício anterior
as emendas de bancada corresponderão a até 1% da receita corrente líquida (RCL) realizada no exercício anterior
para emendas não impositivas, será o valor do exercício anterior (os R$ 11,5 bilhões) atualizados pela variação acumulada do IPCA dos últimos 12 meses.
O senador Mecias de Jesus (Republicanos-RR) propôs uma alteração no cálculo. Ele defende que, e vez de usar a receita corrente líquida, o parâmetro seja a receita primária líquida.
A diferença entre os dois indicadores é simples. A receita primária líquida é maior, porque não desconta as transferências da União para estados e municípios.
Na prática, se o indicador mudar, o montante destinado às emendas fica maior. O que pode ser um problema, já que o dinheiro disponível no caixa do governo continuará sendo menor.
“Essa flexibilidade é essencial para garantir que, em cenários de expansão econômica, o Legislativo possa atender a um número maior de demandas regionais, promovendo uma distribuição mais ampla e eficiente dos recursos públicos. Ao vincular o ajuste ao crescimento da receita primária líquida, esta emenda respeita os princípios de responsabilidade fiscal”, afirmou o senador.
Fonte: G1