R$5.438.512,94 (cinco milhões, quatrocentos e trinta e oito mil, quinhentos e doze reais e noventa e quatro centavos). Este é o valor do prejuízo calculado pelo Ministério Público Estadual de Alagoas (MPE/AL) que teria sido causado ao município de Passo de Camarabibe, entre os anos de 2013 e 2015, em função do superfaturamento para contratação de veículos. Por conta dessa ilegalidade, a Promotoria de Justiça daquela cidade ajuizou uma ação por ato de improbidade administrativa contra a prefeita Márcia Coutinho Nogueira de Albuquerque e outras três pessoas, além de duas empresas e pediu ao Poder Judiciário o afastamento da gestora do cargo.
De acordo com o promotor de Justiça Vinícius Calheiros, propositor da ação, até o ano de 2012 a Prefeitura promovia os aluguéis por meio de contratados firmados diretamente com os proprietários dos veículos, que, na maioria das vezes, também eram responsáveis por sua condução. No entanto, a partir de 2013, após assumir o cargo de prefeita, Márcia Coutinho substituiu tais contratações por apenas uma única empresa, a JB Locação de Veículos LTDA e tal negócio não ocorreu através de procedimento licitatório. Usando como argumento o art. 15 da Lei nº 8.666/1993, ela aderiu a ata de registro de preços nº 08/2013/Matriz de Camaragibe e o acordo foi firmado para a contratação de 34 veículos, entre ônibus, carros de passeio e máquinas pesadas. Porém, o que achamou a atenção do MPE/AL é que a empresa vencedora não possuía nenhum veículo em seu nome e acabou por sublocar os automóveis que já prestavam serviços ao Município.
“A substituição das contratações diretas não trouxe, assim, qualquer benefício extra, já que os serviços permaneceram sendo prestados pelas mesmas pessoas com os mesmos veículos. Nada obstante, o valores pagos como contraprestação quase triplicaram. A título de exemplo, cumpre citar o caso de Adriano Monteiro de Melo e de Josuélson Batista dos Santos, ambos motoristas locatários de ônibus para o transporte escolar municipal. Até maio de 2013, eles eram contratados diretamente pelo Município e recebiam a quantia de R$3.240,26 (três mil e duzentos e quarenta reais e vinte e seis centavos). A partir do mês seguinte (junho de 2013), esses mesmos motoristas deixaram de ser contratados pela Prefeitura, mas continuaram prestando os serviços na qualidade de subcontratados da JB. No entanto, o valor pago foi majorado para cerca de R$12.321,54 (doze mil e trezentos e vinte e um reais e cinquenta e quatro centavos)r, o que epresenta um acréscimo superior a 280%”, revela um trecho da ação.
“Em relação aos serviços prestados ao Município, a JB se apresenta como verdadeira empresa de fachada. Isso porque ela não possui, em Passo de Camaragibe, um único veículo próprio dedicado aos serviços: são todos subcontratados. Também não possui escritório ou qualquer estrutura que dê apoio aos extensos serviços que presta. A função da JB encontra limites no simplório recebimento de valores do município, seguido do repasse de uma fração desses mesmos valores para as pessoas que a própria Prefeitura indicou para serem contratados. Destarte, trata-se de pessoa jurídica utilizada como mero instrumento facilitador da prática dos atos de improbidade administrativa que aqui se noticiam”, acusa o promotor Vinícius Calheiros.
Os serviços não fornecidos e o valor do prejuízo
Segundo as investigações do Ministério Público, a Prefeitura também aceitava que a JB Locação de Veículos LTDA não respeitasse as regras do contrato no tocante a quantidade de veículos que deveriam trabalhar para o Município. “É importante notar que o superfaturamento não se revela apenas através da superelevação dos preços. O ilícito é ainda praticado através do pagamento por serviços que não são ofertados pela empresa locadora. Nesse ponto, vale lembrar que, de acordo com o contrato celebrado entre o Município e JB, a empresa deveria fornecer não só os veículos alugados, mas também motoristas, combustível e manutenção. Entretanto, pelas informações repassadas pela própria Prefeitura, diversos carros alugados não possuem qualquer condutor e outros tantos são dirigidos por servidores municipais. Até mesmo secretários foram arrolados como motoristas. É o caso de Jannayna de Hollanda Malta Gaia (secretária de Educação e motorista do veículo de placas ORL-5365), José Jair dos Santos (secretário de Administração e condutor do veículo ORL-9215) e de Erivan Inácio dos Santos (chefe de gabinete e motorista do veículo de placas NMC-9804).
A existência de servidores-motoristas e de veículos sem indicação de condutor revela que a JB não oferece todos os serviços pelos quais é remunerada, o que também importa em superfaturamento. E, como se já não bastasse a ausência desses profissionais, a empresa também deixou de oferecer muitos dos automóveis que lhe foram locados. Com efeito, embora conste do contrato o aluguel de ambulâncias e máquinas pesadas (retroescavadeira e pá- carregadeira), não há na relação quaisquer desses veículos, o que demonstra que o Município vem pagando por serviços que nunca lhe foram fornecidos”, revela outro parágrafo da ação por ato de improbidade administrativa.
Para o promotor, após calcular os anos do contrato firmado entre Poder Executivo e JB Locação de Veículos LTDA, o dano ao erário é estimado em R$5.438.512,94. “Esse valor foi calculado a partir do valor global do contrato e do percentual de superfaturamento sobre cada veículo que, anteriormente, prestava serviços ao Município”, detalha a ação.
Além da prefeita Márcia Coutinho Nogueira de Albuquerque, são alvos da ação do MPE/AL Renato Brandão Araújo Filho e Kitéria Blanche Nascimento Alves, donos da JB Locação de Veículos Ltda; e Paulo Victor Coutinho Nogueira de Albuquerque, filho da gestora de Passo de Camarabige. As empresas JB, Auto Posto Ouro Preto Ltda e P. A. Construções de Imóveis Ltda também estão sendo processadas. As duas últimas são de propriedade da família de Márcia. De acordo com a Promotoria de Passo, a prefeita, para tentar despistar os órgãos fiscalizadores e de controle, não tem bens registrados em seu nome e os coloca nos nomes dos filhos.
Pedido de afastamento e de indisponibilidade de bens
O promotor Vinícius Calheiros pediu ao Juízo de Passo de Camarabibe o afastamento de Márcia Coutinho da função pelo menos enquanto durarem as investigações e o trâmite da ação. “No caso dos autos, trata-se de esquema de improbidade em plena execução, de forma que o afastamento da gestora se faz necessário não só em vias de interromper a prática dos atos como também de obstar que a demandada forje contraprovas, ameace testemunhas ou pratique toda sorte de atos a fim de elidir o objeto. Destarte, com base na robusta prova documental carreada aos autos e a indiscutível necessidade de celeridade no provimento jurisdicional requerido, em vistas a evitar a ocorrência de prejuízo a instrução probatória do feito, bem como a dilapidação do patrimônio público municipal, faz-se necessário, com fundamento no art. 20, parágrafo único, da Lei nº. 8.429/92, o imediato afastamento do cargo público dos agentes públicos demandados”, foi o que requereu o MPE/AL.
A Promotoria de Justiça também entende que, nos autos da ação, há “indícios veementes, senão provas cabais” de que os contratos mantidos pelo município com a JB foram superfaturados, o que comprova a prática de ato de improbidade e, claro, prejuízo ao erário, portanto, ela também pediu a indisponibilização dos bens dos demandados. Além disso, solicitou ainda a quebra dos sigilos fiscais de todos os envolvidos nos atos ilícitos.
Ascom MPE