O anúncio da suspensão de concursos federais em 2016 não trouxe apreensão apenas para os estudantes que vivem em meio aos livros – mas também para os cursinhos preparatórios, que lucram com o sonho de milhares de pessoas de conquistar um cargo público que dê a elas estabilidade. As provas para os órgãos da União são as “queridinhas” dos concurseiros, já que os cargos apresentam os maiores salários no serviço público. Sem a certeza das vagas, há quem prefira não investir dinheiro nas aulas e apostilas, o que repercute diretamente no faturamento das escolas.
Um dos maiores e mais tradicionais cursinhos da capital mineira, o Orville Carneiro recorda de uma queda de 20% das matrículas em 2008 e 2011, anos em que concursos federais também foram adiados. “Mas recuperamos as perdas assim que foram publicados os editais”, disse a coordenadora da escola, Ana Karine Faria Senra. Ela conta que o alarme inicial foi substituído por uma certa tranquilidade com a confirmação de que os concursos já autorizados serão mantidos, tais como os do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), Advocacia Geral da União (AGU) e Ministério da Educação (MEC).
Para os concurseiros “profissionais”, o adiamento na realização das provas pode até ser positivo. “É mais tempo para estudar. Especialmente para quem vai disputar, por exemplo, vagas na Polícia Federal e Receita Federal, que são mais difíceis e demoram de um a dois anos para o candidato passar. Só vai parar de estudar quem não conhece como funciona um concurso público”, explica Ana Karine Faria. Além disso, ela lembra que há vários concursos para cadeiras em órgãos municipais e estaduais em andamento, o que justifica a necessidade de continuar os estudos.
Estratégia Expectativa semelhante tem Nylton Andrade, gerente do curso Meritus na modalidade on-line. Por ser um preparatório à distância, ele explica que são vendidas aulas para concursos do Brasil inteiro – o que acaba minimizando a redução nas matrículas com o adiamento das vagas federais. A estratégia da escola, segundo ele, é incentivar a preparação permanente dos candidatos, além de informar sobre as demais seleções em andamento. “Esse é um problema para os alunos, porque vêm a notícia e acham que não terá mais concurso nenhum. E não é assim”, argumenta Nylton Andrade. O curso tem uma média de 30 mil a 50 mil alunos matriculados em todo o país.
Segundo a diretora do Pleno Preparatório, Cristiane Mota Magalhães, não dá para falar que não assusta, mas, em sala de aula, a missão é tentar controlar a situação para o aluno não ser afetado psicologicamente. “Não enxergo com tanta preocupação, porque no início do primeiro mandato do governo Dilma foi feito o mesmo, e, depois, vieram muitos concursos”, afirma. Magalhães lembra que Banco do Brasil, Caixa, Petrobras e outras empresas estatais que não dependem do Orçamento da União diretamente não são afetados pela decisão. Neste ano, o INSS deve publicar ainda edital com quase 1 mil vagas.
Esperança Entre os alunos, o sentimento inicial foi de susto com o anúncio da equipe econômica. Mas, aos poucos, com a orientação de cursos preparatórios, o desespero começa a ser contido. Em busca de uma vaga no Instituto Nacional da Seguridade Social (INSS), Arlen Álvaro, de 31 anos, achou que o concurso fosse ser suspenso, mas logo percebeu que o órgão já tinha conseguido autorização para aplicar as provas, o que impede qualquer adiamento.
Com isso, ele diz ser preciso focar ainda mais nessa oportunidade, caso contrário terá que esperar mais tempo até a próxima seleção. “A esperança é que seja temporário. Afinal, foi só suspensão, não é cancelamento”, diz sobre a medida que adia os concursos. Caso não seja aprovado no INSS, outra possibilidade é focar em vagas na esfera estadual e municipal. Com isso, a tendência é que os candidatos concentrem esforços, o que inevitavelmente aumentará a concorrência.
Assim como Arlen, o advogado Marcelo Rodrigues, de 41, foca os estudos no concurso do INSS. Depois de refletir bastante sobre o teor da medida, a ideia dele é ampliar o tempo dedicado aos estudos para garantir a aprovação no concurso e não ter que passar sufoco com a maior concorrência em seleções estaduais e municipais no ano que vem. “Conseguir a vaga (do INSS) é ficar livre de qualquer medida governamental”, afirma Rodrigues.
Segundo o Ministério do Planejamento, a suspensão dos concursos públicos previstos para 2016 abrangem mais de 40 mil vagas referentes ao Ministério Público da União e aos três poderes. A medida deve resultar em economia de R$ 1,5 bilhão. “Mais eficaz seria cortar cargos comissionados”, afirma o engenheiro químico Mateus Garcia Lima, de 25 anos.
Com a redução dos investimentos, Mateus concentra seus esforços na busca por uma vaga no setor público, principalmente por causa da estabilidade. Mas o adiamento de novas seleções pode resultar em um tempo maior de espera pela vaga. Sem perder o foco, ele diz que a saída é manter-se concentrado nos estudos até a retomada da economia. “(A crise) é algo cíclico. A economia volta a fluir”, diz Lima. E acrescenta: “Concurso não é algo imediato. Tem que ter paciência.”
NÚMEROS
40 mil
São as vagas federais que seriam disputadas em 2016
R$ 1,5 bilhão
É a economia gerada com o adiamento dos concursos
Fonte:Estado de Minas – Isabela Souto / Pedro Rocha Franco