KENNEDY ALENCAR
BRASÍLIA
A estratégia do governo para reagir à perda do grau de investimento na Standard & Poor’s é propor novo corte de gastos suficiente para tapar o rombo no Orçamento da União de 2016 e elevação de impostos suficiente para cumprir a meta de superávit primário do ano que vem.
A ideia é realizar cortes de despesas em torno de R$ 30 bilhões. Na equipe econômica, já há estudos que dizem ser possível R$ 25 bilhões em mais redução de despesas. Seria preciso buscar exatamente mais R$ 5,5 bilhões, porque o deficit primário previsto para 2016 é de 0,5% do PIB (Produto Interno Bruto), o que equivale a R$ 30,5 bilhões.
Para atingir a meta de superávit primário de 0,7% do PIB, cerca de R$ 42 bilhões, haveria aumento temporário de tributos. O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, acha pouco um ano de vigência emergencial. E sabe que haverá resistência, porque tributos foram criados temporariamente e se tornaram permanentes. Um horizonte de dois anos seria o ideal, na visão de outro ministro.
Uma ideia forte é mesmo uma nova CPMF temporária, assumidamente para fortalecer a política fiscal. Outra possibilidade é elevar a Cide, que é um tributo que incide sobre os combustíveis. No caso, seria elevada apenas para a gasolina. A Cide teria simpatia de governadores, porque parte da arrecadação ficaria com os Estados. Esse é o plano de ação em linhas gerais, sujeito a adaptações por eventuais resistências.
Ao final da reunião de ontem da presidente Dilma Rousseff com outros ministros, um deles resumiu assim o encontro: “A ficha caiu”. A presidente sabe que precisa agir para evitar um “efeito dominó”, que outras agências sigam a Standard & Poor’s, porque isso agravaria ainda mais a crise.
Uma decisão importante foi definir que a estratégia será primeiro realizar uma série de corte de gastos em despesas que controla, as chamadas discricionárias. A intenção é mostrar à sociedade, aos empresários e ao Congresso que o governo fará nova dose de sacrifício. É provável que o Ministério do Planejamento já faça hoje anúncio de alguma medidas dessa natureza.
O segundo passo será definir uma proposta de corte de despesas obrigatórias e quais impostos o governo deseja elevar, porque esses dois passos dependem de apoio político no Congresso, de empresários e de sindicalistas.
Outra decisão importante da reunião de ontem no Palácio do Planalto foi designar Joaquim Levy para dar entrevista a fim de mostrar que a perda do grau de investimento fortaleceu as ideias que o ministro da Fazenda defende internamente e que eram boicotadas pela presidente e outros ministros.
Levy foi claro. Haverá sacrifício, com uma mistura de corte de gastos e aumento de impostos. Ambas as medidas são difíceis, mas são aquelas que o ministro da Fazenda defendia como necessárias para evitar a perda do grau de investimento.
A presidente Dilma adotará uma receita que rejeitava e que, se tivesse sido aplicada antes, teria um custo menor. A presidente paga o preço de sempre decidir atrasada. Vai adotar no nono mês do segundo mandato medidas que deveria ter implementado logo após ter sido reeleita.
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Os efeitos econômicos negativos da perda de grau de investimento estão apenas no começo. O Brasil ainda manteve o selo de bom pagador em outras duas agências mais influentes, a Moody’s e a Fitch. Obviamente, o papel mais importante para a saída da crise é do governo, que precisará apontar o caminho.
Mas a sociedade, como disse ontem Levy, também terá de fazer escolhas. Isso significa que o empresariado e o Congresso, do PT à oposição, precisarão dar sua parcela de contribuição. Uma coisa é a luta política contra o governo, que é feita legitimamente pela oposição. Outra coisa é incendiar o país.
O mesmo vale para os empresários. Quando houve a desoneração de impostos, não disseram que isso poderia tirar dinheiro para sustentar a política fiscal e arruinar o superavit primário. O governo reonerou alguns setores sob tremenda gritaria e fogo cerrado no Congresso.
Empresário adora um lobby para defender o seu interesse privado. É da lógica do seu negócio a busca para maximizar ganhos. Mas há muito mais em jogo. É fato que o governo erra muito, mas a saída da crise não depende só dele.